Os chineses já colocaram, segundo Forças Armadas dos EUA, US$ 180 bilhões (R$ 964 bilhões) em programas de infraestrutura de países da região -muitos no sul da América
![]() |
© José Cruz/Agência Brasil
|
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A presença da China na América
do Sul, uma preocupação frequente dos Estados Unidos, entrou oficialmente no
radar militar brasileiro. O risco de um confronto armado na região, também.
A atualização dos textos irmãos PDN (Política de Defesa
Nacional) e END (Estratégia Nacional de Defesa), que será enviada ao Congresso
no dia 22, mostra preocupação especial com os chamados "atores
exóticos" no continente.
Os chineses já colocaram, segundo conta do Comando Sul das
Forças Armadas dos EUA, US$ 180 bilhões (R$ 964 bilhões) em programas de
infraestrutura de países da região -muitos no sul do continente. Aderiram ao
estratégico programa chinês Iniciativa Cinturão e Rota 25 das 31 nações
latino-americas.
Segundo o chefe do comando, almirante Craig Faller, a China
abriu uma "armadilha econômica" para os empobrecidos países da
América Latina.
Como já acontecia nas versões anteriores, a Amazônia é
tratada como alvo de cobiça externa. Um documento preliminar sobre cenários
para defesa até 2040, que o jornal Folha de S.Paulo revelou em fevereiro,
mostrava que a França era vista como a maior ameaça estratégica ao país.
O país europeu está à frente de críticas à política
ambiental do governo Jair Bolsonaro e faz fronteira física por meio da Guiana
Francesa com a região -o que não a torna um "ator exótico". A
diplomacia de Paris considerou a hipótese de confronto delirante.
Como documento de Estado, a dupla PND/END não nomeia
ameaças, apenas apresenta objetivos e como chegar a eles com os recursos
disponíveis, que são inventariados num terceiro documento em atualização, o
Livro Branco de Defesa Nacional.
A primeira PND é de 1996, e teve três atualizações até 2016.
A END teve edições em 2008, 2012 e 2016. O Livro Branco terá sua primeira
revisão desde 2012.
Mudanças geopolíticas, portanto, são esperadas, embora nada
muito radical. O desapreço do governo Bolsonaro pelas instituições
multilaterais, por exemplo, não se reflete no texto: a Organização das Nações
Unidas não surge como a vilã globalista pintada pelo Itamaraty atual, por
exemplo.
Por outro lado, há realidades: a União das Nações
Sul-Americanas e o Conselho Sul-Americano de Defesa, entidades criadas pelos
governos de esquerda que dominaram o continente nos anos 2000-10, desapareceram
na prática.
Logo, não são mais louvadas como fórum de integração, como
na versão da PND/END vigente, como foram no passado sob governos do PT.
Segundo pessoas envolvidas na confecção do documento, que
ainda está sendo revisado e não tem versão final pronta, o alinhamento do
Brasil aos EUA, preconizado por Bolsonaro, não se reflete nos textos.
A posição brasileira de recusar a adesão a protocolos
adicionais do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, algo que os americanos
gostariam de ver assinada, deve ser mantida na atualização.
No ano passado, o Brasil virou aliado preferencial dos
americanos fora do escopo da Otan (aliança militar ocidental) e assinou um
importante acordo de cooperação tecnológica no setor. Mas, na prática, nada
ainda aconteceu.
Além de Pequim, Moscou também chama a atenção das Forças
Armadas devido a seu apoio explícito à ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela,
aí no campo mais exclusivamente militar -como "atores exóticos", os
russos não têm nada do peso econômico chinês.
Daí surge, naturalmente sem nomes, a preocupação com o país
ao norte da fronteira brasileira. Antes, o documento não antevia risco de
conflitos na região, mas, como mostrou nesta quinta (16) o jornal O Estado de
S. Paulo, a preocupação se faz presente.
No ano passado, os EUA coordenaram com Brasil e Colômbia
reações à crise venezuelana, e num dado momento os militares brasileiros
tiveram de intervir para evitar as tentações do Itamaraty de se chocar com
Maduro.
A tensão, contudo, permanece, apesar de o ditador ter
estabilizado relativamente seu poder.
O dito entorno estratégico inclui o Atlântico Sul, área em
que o Brasil mira um reforço militar com a programada construção de novas
fragatas leves.
Aqui a preocupação é a mesma apontada nas versões anteriores
dos documentos: negar acesso a inimigos que possam bloquear o país e monitorar
comportamentos marítimos suspeitos.
O texto pede, como a Folha de S.Paulo mostrou na semana
passada, regularidade orçamentária para os programas militares -muitos deles
atrelados a compromissos internacionais, como no caso do caça sueco Gripen ou
dos submarinos de origem francesa Scorpène.
O Ministério da Defesa pede 2% do Produto Interno Bruto para
defesa de forma fixa, como educação (18%) e saúde (15%) são entronizadas na
Constituição.
Esta é a meta da Otan (aliança militar ocidental), atingida
apenas por 7 dos 29 membros do grupo, o que sempre gera tensão com o sócio
majoritário, os Estados Unidos.
Hoje, o país gasta cerca de 1,3% do PIB com defesa. Em 2019,
dos R$ 109,9 bilhões destinados ao setor, R$ 80 bilhões foram para pagamento de
pessoal, e R$ 47,7 bilhões gastos com o pessoal inativo (reserva e
pensionistas). A meta vigente da Otan não inclui inativos.
O país tem o 11º orçamento militar do mundo, na métrica do Instituto
Internacional de Estudos Estratégicos, de Londres. Mas a distorção no dispêndio
faz com que se invista pouco.
O ministro Fernando Azevedo (Defesa) disse na semana passada
que as três Forças estão defasadas operacionalmente, apesar dos programas em
curso.
Por outro lado, o setor militar foi o que mais expandiu
gastos na Esplanada dos Ministérios em 2019, além de garantir a execução de seu
orçamento. A crise decorrente da pandemia coloca essa trajetória em dúvida
agora.
Por: Notícias ao Minuto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário