sexta-feira, 29 de agosto de 2025

SEM BELEZA, SEM AMOR?

Maria Teresa Freire.


Acreditei, como a moça ingênua que eu era, que amizade sempre é sincera.  Eu não entendia que o adverbio ‘sempre’ fazia uma grande diferença, dependendo das pessoas e das circunstâncias. Tive várias amigas na infância. Eu era uma garotinha muito bonita, parecida com minha mãe, uma mulher linda, de uma beleza clássica, que chamava a atenção assim que entrava em um ambiente. Além disso era educada e muito cordial com as pessoas. Tinha, ou melhor, tem um senso de solidariedade enorme.

Eu, entretanto, era e sou bem diferente dela em relação ao jeito de ser. Enquanto pequena, éramos muito parecidas. Todos diziam isso. Quando a adolescência chegou, minha aparência foi se modificando, distanciando-se cada vez mais do rosto bonito da minha mãe. E apresentando semelhança com o meu pai: um ‘cara’ espetacular, mas feioso. Todavia, minha lindíssima mãe era apaixonada por ele, que era realmente formidável, inteligente, engraçado, gentil e um ‘paizão’ protetor. Mesmo assim, feioso. E eu, com uma face se assemelhando cada vez com a dele, ou seja, ficando feiosa.

Porém, enquanto eu era linda, as amiguinhas eram várias e os garotos sempre me assediavam. Uma popularidade aparente que se comprovou falsa com o passar do tempo. Entretanto, uma amizade era diferente. Um colega que sofria bullying porque era gordinho. Eu o protegia e livrava-o das brincadeiras maldosas que os colegas faziam. No último ano da escola ele se mudou com os pais e perdemos contato.

Alguns anos depois ele retorna. Eu havia terminado minha faculdade de Farmácia, com foco em Farmácia Clínica e trabalhava com meu pai, que tinha duas grandes farmácias. Não pensava muito nele. Com certeza continuava gordinho. Ele me procurou. Eu havia mudado de bairro, mas ele conseguiu me localizar por meio de amigos em comum. Telefonou-me. Queria me ver. Combinei encontrar com ele, em um parque onde eu gostava de caminhar.

No dia marcado, eu fiquei por perto para ver se ele aparecia. E quando eu o vi fiquei surpresa. Não era mais gordinho, e sim magro e alto. E para completar, bonito. Eu, a feiosa, nem me aproximei. Telefonei a ele e expliquei que havia surgido uma emergência no trabalho e não poderia encontrá-lo. Marcamos para a próxima semana.

Eu iria encontrá-lo? Não!!   Ele se lembrava de mim como uma garota bonita. Essa fase havia passado e agora eu era a ‘cara’ do papai. Feiosa! Pedi a uma amiga para se passar por mim e que fosse ao encontro. E assim aconteceu. Como ela era bonita, ele se encantou. E ela também. 

Os dois passaram a se encontrar. Ela, a amiga, nem me relatava nada. Passou a me perguntar sobre minhas preferências, escolhas, enfim sobre minhas particularidades. Comecei a perceber que ele deveria estranhar o jeito dela. Apesar de sermos amigas há muitos anos, ela não me conhecia totalmente. Meus pensamentos mais íntimos eram somente meus.

Todavia, a ‘amiga’ gostou de se passar por mim e queria ficar com aquele garoto de quem eu gostei desde a infância e poderia continuar a gostar, agora, que somos adultos. Confiei em uma pessoa que sempre demonstrou ser minha amiga. Aproveitou-se da minha confiança e ingenuidade e comportou-se como uma falsa amiga, desconsiderando meus sentimentos e meus medos.

Eu refleti tristemente sobre toda a situação. A amizade se transformou em falsidade quando o interesse foi mais forte, quando a possibilidade de conquistar um namorado, um futuro marido, uma situação de vida melhor lhe caiu de graça nas mãos. Que tipo de pessoa se comporta assim com sua ‘melhor amiga’? Até que ponto a honestidade vale mais ou menos quando o interesse interfere?

Entretanto, duas semanas depois eu recebo um telefonema dele. “Não desligue, não desconverse e ouça o que eu tenho a lhe dizer: não quero que você envie outra pessoa no seu lugar para me encontrar;  eu descubro que não é você, pois eu conheço bem seu jeito de ser. Por isso, fui conversar com seus pais e eles me contaram sobre o seu medo de me rever porque não é mais aquela garota linda da infância. E eu gostava de você só por causa disso? Eu vim em busca de você depois de tantos anos só porque você era linda?  Mulheres lindas existem aos montes. Mas você só há uma e foi por isso que voltei. Meu pai fundou uma empresa no exterior, mas ele quer voltar para cá; eu vim para abrir a filial aqui e depois ele vem definitivamente com o resto da família. E não pensei em outra coisa senão na oportunidade maravilhosa de revê-la. Portanto, pare de bobagem e vamos marcar nosso encontro para amanhã. Se você não aparecer farei acampamento na frente da farmácia em que você trabalha. Estamos entendidos? Eu só quero ouvir sim”.

Eu respondi: “sim”.  E fui encontrá-lo.

Em que resultou nosso verdadeiro encontro: casamento e três anos depois filhos gêmeos. Um casal. O menino parecido com o pai sem ser gordinho, mas a menina era a minha cara (de quando feiosa) e o pai a chamava de “minha princesa”. Ela perguntava ao pai: “se eu sou sua princesa a mamãe é o que?”  Ele respondia com um sorriso encantador: “ela é a minha rainha”.

Por: Maria Teresa Freire - Jornalista, Escritora, Poeta, 
Presidente da AJEB – Coordenadoria do Paraná.
Presidente da ALB - Paraná.

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