'CRÔNICAS' A SECA, O FLAGELO

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José Vieira Passos Filho.


A seca no nordeste brasileiro é recorrente. Inspirou escritores famosos como Graciliano Ramos, em “Vidas Secas”, de 1938 e Raquel de Queiroz, em “O Quinze”, de 1930. Os dois romances retratam retirantes fugindo da fome e da sede, a procura de melhores condições de vida. Em “Viçosa de Alagoas”, Alfredo Brandão, em 1914, descreve o flagelo do sertanejo, em sua retirada para a antiga Villa de Assembléia, a procura de melhores condições de vida. Diz: “A sêcca de 1877, que flagelou o norte do Brasil, também extendeu os seus horrores pela província das Alagôas, e mui especialmente pelos municípios do sertão.” Mais adiante acrescenta: “Por todas as estradas entravam levas e levas de sertanejos andrajosos, sórdidos, miseráveis e famintos.” 

Publicações de 2011 já noticiavam a seca e seus efeitos danosos, condenando as “medidas paliativas, que não resolvem os problemas estruturais da região do país, mas enchem os bolsos dos que sobrevivem à custa desse hediondo flagelo.” Dizem também: “Já os carros-pipa, ícones da chamada indústria da seca no Nordeste...” E ainda: “A seca atual é considerada a pior em décadas – há quem diga que não se vê nada igual em mais de 50 anos.” 

Relatos históricos identificam dezenas de secas no nordeste brasileiro desde a década de 1580. 

A mais inclemente das secas será a de 2017? A que estamos vivenciando? Com certeza seus efeitos serão devastadores, pois já está se estendendo até para a Zona da Mata, a menos de 100 km das capitais nordestinas. Os rios secaram e as cidades já estão sendo abastecidas por carros pipas. Os moradores de muitas localidades não estão preparados para a inclemência da falta d’água, das altas temperaturas. O povo está apavorado, atônito. A seca é mais devastadora porque a população do século XXI é bem maior quer a dos séculos anteriores.

A água é o bem mais precioso da humanidade. É a fonte de vida do ser humano. A água está sendo desperdiçada das mais diversas maneiras: com a poluição dos rios que passam nas áreas urbanizadas que não tratam seus esgotos e não fazerem seu reuso para poupar os mananciais. A água está ficando mais escassa por causa do desmatamento próximo às nascentes. Os rios estão secando. Os povos não estão conscientes que a água está desaparecendo. Hoje, já existem milhares de pessoas no mundo sofrendo com a falta d’água; o nordestino está nessa lista. Muitos povos do mundo já estão em guerra pela posse da água.  

O secular problema nordestino da falta d’água poderia muito bem ser atenuado por políticas voltadas à preservação do meio ambiente; pelo barramento de rios, nas escassas épocas das chuvas. Existem muitas formas de lidar e conviver com a seca.

Hoje, o nordestino, foge da seca bem mais rápido que Fabiano, sinhá Vitória e seus dois filhos. O papagaio não faz mais parte da família, é proibido criar, é ave em extinção. A cachorra baleia, ficou para traz, com o vizinho, pois não pode embarcar em ônibus. Os pobres retirantes, que recebem o benefício do bolsa família, provavelmente irão morar numa das muitas favelas da capital. O Sertão, será uma lembrança. 

O Sertanejo, homem, pessoa, está com fome. Não tem comida na panela, não tem água no pote. Não tem lenha para acender o fogo, porque não tem panela no fogo. Não come, não bebe, não toma banho. O pasto não tem animais, nem plantas. Tudo secou.

O Sertanejo grita: estou com fome! Seu grito é surdo, não chega até lá.

Por que Brasília não ouve?

Por: José Vieira Passos Filho - Pres. da Academia Alagoana de Cultura, Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, Sócio Efetivo da Academia Maceioense de Letras, 
Sócio Honorário do SOBRAMES (AL), Sócio Efetivo da Comissão Alagoana 
de Folclore. Presidente da ALB de Alagoas.


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