CENTENÁRIO DA HECATOMBE DE GARANHUNS

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PRÉ HECATOMBE 

No dia 12 de janeiro, em Garanhuns, Francisco Sales Vila Nova e Melo acusava, de arbitrariedades, o irmão de Júlio Brasileiro, Eutyquio Brasileiro, e os sobrinhos de Júlio, Álvaro Brasileiro e Antônio Rosa, o inditoso articulista foi agredido, tomando uma surra de “cipó de boi”, um instrumento de castigo mais aviltante da época.

No dia 14 de janeiro, cerca das 20h30min, Sales Vila Nova assassinava, por vingança, no terraço do Café Chile, na Praça da Independência, Recife, o deputado estadual Júlio Euthymio da Silva Brasileiro, chefe político de Garanhuns, ex-prefeito daquele município e novamente eleito para o mesmo cargo. Abastado agricultor, com destaque na lavoura cafeeira, Júlio Brasileiro era proprietário, dentre outras coisas, da fazenda Água Branca, no distrito de Brejão.

Devido ao assassinato, que deveria ter fortes repercussões em Garanhuns, o Governador, Manoel Borba, como medida preventiva, nomeou o jovem militar, Theophanes Ferraz Torres, como delegado daquela importante urbe. A missão dele era fazer a vanguarda para, só então, o corpo de Júlio Brasileiro pudesse chegar à cidade, sem maiores problemas.

No mesmo dia (14), a esposa de Theophanes, Amélia Torres e familiares, estavam se deslocando de Bom Conselho de Papacaça, onde Theophanes havia sido delegado, escoltada pelo sargento Pedro Malta e mais dois soldados, Manoel João de Oliveira e Francisco Maciel Pinto, com destino a Garanhuns, onde pegaria o trem, no dia seguinte, com destino ao Recife. No meio do caminho, pernoitaram na fazenda Água Branca, em Brejão, ficando hóspede de Alfredo Brasileiro Vianna, alcunhado por Doca Vianna, sobrinho de Júlio e gerente daquela propriedade.

A HECATOMBE



No dia 15, horas antes da trágica hecatombe, de acordo com depoimento do sargento Pedro Malta, ele e sua comitiva, estavam tomando café, já com os animais encilhados, quando chega telegrama para Doca Vianna, cobrando sua presença em Garanhuns.

Após levar a família do Tenente Theophanes, para a casa do delegado tenente Antônio Pimentel de Meira Lima, recebeu ordens do delegado para que fosse até a cadeia local, auxiliar o cabo Antônio Pedro de Souza, mais conhecido como “Cabo Cobrinha”, alegando o delegado que nada havia demais, pois todos os homiziados estavam garantidos.

Constava-se que o clima reinante na cidade era de imenso terror. O juiz de Direito, Dr. José Pedro de Abreu e Lima, compadre do morto, e o delegado de polícia, tenente Meira Lima, ao que consta, tinham insuflado os ânimos. Parentes do assassino achavam-se ameaçados, declarando-se o delegado impotente para garanti-los.

Liderados por Vicente Ferreira, vulgo “Vicentão”, empregado do deputado morto, os cangaceiros dirigiram-se à cadeia. Inexplicavelmente o delegado Meira Lima foi chamado pelo Juiz, momentos antes da chacina, eram 13 horas e pouco. O sargento Pedro Malta e o soldado Manoel João de Oliveira, que escoltavam a família de Theophanes, participaram do tiroteio contra os agressores e foram feridos.

A luta foi renhida e desigual. Mais de 200 facínoras, contra a guarda da cadeia, composta por apenas cinco homens. O tiroteio durou cerca de meia hora. A primeira vítima a tombar foi o cabo “Cobrinha” e logo após o soldado Ezequiel Cabral de Sousa.

O tenente Theophanes, com uma pequena força, composta por 10 praças embaladas (devidamente municiadas), chegou meia hora após o final do ataque, em trem do horário (comum).

Às 16h50min, o tenente Meira Lima passou o exercício da delegacia para Theophanes. O novo delegado encontrou uma cidade dominada pelo terror: os familiares das vítimas à espera de novos atentados, inclusive o incêndio de suas casas e os julistas na expectativa de uma retaliação imediata por parte dos adversários, pessoas ricas e poderosas, que por certo buscariam um desagravo à altura da afronta sofrida. Como acréscimo suplementar às dificuldades enfrentadas por Theophanes, seus familiares haviam chegado a Garanhuns pouco antes da hecatombe e se encontravam hospedados em casa do tenente Meira, onde reinava um clima de luto por morte de uma filha deste poucas horas antes. Em tais circunstâncias, teria de proceder com muito tato até a chegada dos reforços.

Theophanes foi logo procurado para dar garantias de vida aos que se sentiam ameaçados pelos familiares das vítimas: o juiz Abreu e Lima, o médico Carlos Abreu, seu irmão e respectivas famílias; Ormindo Pires, proprietário da Farmácia Confiança; Fausto Galo, Secretário da Prefeitura; além do apavorado carrasco de Moreira César, Antônio Padilha, todos com mulheres e filhos. A casa do tenente Meira teve de abrigar todos os refugiados.

No outro dia (16) estavam estendidos, em um dos corredores da Igreja Matriz, onze cadáveres de soldados e cangaceiros. Pelas 10 horas da manhã, seguiram os préstitos para o cemitério.

O trem especial, com reforço de 50 homens, que havia saído do Recife, às 16h10min, do dia 15, só chegou no dia seguinte, às 4h40min.

Eutychio e Doca Brasileiro já haviam sido capturados por Theophanes e seriam enviados para a capital, devidamente escoltados, no mesmo trem especial que trouxe o reforço. No trem, repleto de moradores da cidade, não se falava em outra coisa que fosse a referências, poucas lisonjeiras, ao juiz de direito, Abreu e Lima, enquanto outras elogiavam a ação enérgica de Theophanes.

Theophanes, por sua vez, informava ao comando que constava a morte de sete pessoas, de destaque social, que se achavam refugiadas na cadeia, a pedido, e mais seis, sendo duas praças (cabo Antônio Pedro de Souza, vulgo “Cobrinha” e o soldado Ezequiel Cabral Souza, promovidos pos mortem a sargento e a cabo, respectivamente) e mais quatro bandidos do grupo assaltante. Foram feridas oito pessoas, sendo quatro militares (Sargento Pedro Cavalcante Malta, e os soldados, Manoel João Oliveira, Pedro Antônio Dias e Francisco Maciel Pinto, estes promovidos a Cabo de esquadra). Informava, também, que, durante a noite, os bandidos enterraram comparsas ou conduziram diversos feridos. Quanto ao soldado Manoel João de Oliveira, este não resistiu aos ferimentos e faleceu no Hospital Pedro II, no dia 28 de janeiro.

Destacou Theophanes, que havia passado para o Juiz de Direito, 18 indivíduos capturados implicados nos assassinatos, com os devidos inquéritos.

No dia 28 de fevereiro, recolheu-se a sede do comando, no Recife, e, na mesma data foi elogiado pelo Coronel Comandante da Força, o tenente do Exército José Novaes, pelo modo com que se desempenhou como delegado de polícia de Garanhuns. Naquela mesma data, foi promovido ao posto de capitão.





Por: Geraldo Ferraz de Sá Torres Filho – Membro Efetivo da Academia de Letras e Artes do Nordeste Brasileiro, Academia de Letras e Artes de Gravatá, Academia Recifense de Letras, Academia de Letras do Brasil e Sócio Correspondente da Academia Serratalhadense de Letras.



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