EUCARISTIA NEGADA

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José Vieira Passos Filho.


Tio Dija tinha um grande amigo em Viçosa, Juca Nanes. Eram amigos de muitos anos, desde jovens. Sempre que se encontravam, principalmente aos sábados, paravam num boteco e ficavam bebendo. O porre era inevitável. Juca morava na Rua do Cravo. Mesmo ébrio conseguia chegar em casa. Tio Dija quando ainda estava consciente, alugava um carro e terminava a bebedeira na venda de Cante, no Bananal, porém muitas vezes era preciso alguém ir buscá-lo em Viçosa.

O amigo faleceu em 30 de janeiro de 2008. A Viúva avisou ao Dija da missa de um ano de falecimento. Seria na sexta-feira.

Naquele dia Dija estava impaciente, preocupado em arranjar um transporte para ir à Viçosa. A missa seria às 5 da tarde. Luciano tentou acalmá-lo:

-Pai, não se preocupe que estou indo para Maceió às 4 horas, deixo o senhor na porta da igreja, ligue para o Celso que ele está vindo de Maceió e pode trazer o senhor de volta para o Bananal. É nessa hora que ele está passando por Viçosa.

Eram 4 da tarde quando atendi um telefonema de tio Dija.

-Celso, você está vindo para Bananal, a que horas? Perguntou.

-Tio Dija, devo sair de Maceió, por volta das 5 horas, por que?

-Então quando você passar em Viçosa, eu estou esperando na Rua do Cravo, na casa da viúva de Juca, hoje é a missa de ano de falecimento dele.

-Está certo, apanho o senhor lá.

Luciano atrasou-se. Tio Dija aperreou-se e foi a pé para o Mororó, que fica a dois quilômetros de Bananal, pegar um “bigu” na estrada principal. Ele esperou em vão e não passou nenhum carro. Terminou indo com Luciano quando já era um pouco mais de 5 horas. Chegou atrasado à missa, durante a Proclamação do Evangelho. A igreja não tinha muita gente e sua chegada não passou despercebida pelo padre. Sentou-se num banco ao lado de um conhecido.

Na hora da Consagração, o padre perguntou quem ia comungar levantasse a mão, para contar e consagrar as hóstias. Tio Dija sinalizou, iria comungar. Ia fazer um pedido a Deus pela alma de seu grande amigo Juca Nanes. O padre viu tio Dija com a mão levantada e fez o seguinte comentário, em público:

-Senhor, Djalma, você não pode comungar porque chegou atrasado à missa.

Ele não ouviu o recado do padre, o amigo que estava ao seu lado sabendo que ele ouvia pouco foi quem o alertou.

-Dija, o padre disse que você não pode comungar porque chegou atrasado na igreja.

Ele ficou pasmo com aquela determinação, porém resignado. Estava decepcionado por não pode fazer aquela gentileza para o amigo Juca.

Depois da missa foi cumprimentar a viúva e ouviu dela o comentário:

-Não fique contrariado não, Dija, esse padre é assim mesmo, diferente.

Um pouco depois das 6 horas da noite apanhei tio Dija em Viçosa. Quando entrou no meu carro a primeira coisa que disse foi o episódio da eucaristia negada. Queria saber a minha opinião.

-Então, Celso, você acha que uma pessoa por chegar à missa atrasado, tendo um justo motivo, o padre pode recusar de lhe dar o sacramento da comunhão?

-Tio Dija, não vou dar minha opinião quanto ao fato de o senhor não poder comungar por ter chegado atrasado, mas o que posso afirmar é que esse padre é muito mal educado, pois dizer aquilo em público, conhecendo o senhor do Bananal, sabendo da sua idade. Ah, que foi muita indelicadeza, isso foi.

Chegamos a Bananal e o caso do padre passou a ser o comentário da noite. Quando fui para a casa de tia Ilca observar o jogo de baralho e bate-papo, estava lá Maria Ilza que já sabia do acontecido, então ela me disse:

 -Esse padre realmente tem essas extravagâncias, veja você, José Celso, ele, o padre, não admite que homem entre na igreja de bermuda, não é um absurdo? Também, naquela hora onde todos os padres convocam os fiéis para se solidarizarem em Cristo, ele não faz isso porque, diz ele: - “para não contaminar sua mão, visto que em seguida, vai colocar a hóstia consagrada na boca”.

A decepção de tio Dija foi muito grande, mas não abalou sua fé. Enquanto um padre dá mal exemplo, centenas deles são educados, dedicados e piedosos.

Fica aqui registrado o acontecido para que, se algum dia, um membro da igreja católica ler essa crônica e achar que ouve erro no procedimento do padre, que de público, peça desculpas a esse filho de Deus, Djalma Leite, por esse contratempo.

Por: José Vieira Passos Filho - Pres. da Academia Alagoana de Cultura, Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, Sócio Efetivo da Academia Maceioense de Letras, Sócio Honorário do SOBRAMES (AL), Sócio Efetivo da Comissão Alagoana de Folclore.




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