OLHARES ALÉM DOS MUROS

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Maria Teresa Freire.


Os comentários corriam soltos pela vizinhança. As mocinhas falavam aos cochichos, escondidas, para que suas mães não ouvissem. Parecia haver um alvoroço entre as moradoras mais jovens. Tudo isso por causa de um novo vizinho. O bairro, estritamente residencial, possuía uma rede informações (eu diria de comentários, ou seria fofocas?) bastante eficaz. As novidades se espalhavam rapidamente. Faria inveja a qualquer departamento de investigação e comunicação oficial. 

Entretanto, era um bairro muito bem estruturado e cuidado, ideal para se criar os filhos, por isso havia muitas crianças e jovens que, além de vizinhos, também eram amigos. As casas eram grandes, com amplos cômodos, varandas e jardins que permitiam a organização de festas e encontros. Sobretudo das jovens que perturbavam seus pais para que permitissem realizar suas comemorações. Assim acontecia. Quase todo mês. Não simples festinhas, mas belos eventos que as mães, estimuladas por suas filhas, preocupavam-se em se esmerar na organização, para que fosse elogiada. 

Essas ‘moiçolas’, como vizinhas e amigas que eram, encontravam-se frequentemente. Algumas frequentavam o mesmo colégio. Outras iam às mesmas aulas de balé, de pintura, de francês, de inglês, etc. Estavam sempre juntas e se atualizando das novidades que aconteciam no bairro. 

Dessa forma, a chegada de um rapaz para morar em uma das casas foi a causa de muito tumulto. Como ninguém tinha informações corretas sobre o recente inquilino, as invenções se superaram. O homem em questão havia sido taxado de traficante, de espião, de louco, pois ele trabalhava em casa e só cumprimentava friamente os vizinhos, sem dar ensejo para conversa. Inventaram que ele havia matado a mulher, que estava em prisão domiciliar. Até que era um escritor fantasma (ghost writer). Isso seria melhor. A imaginação criou de tudo para o homem, que ainda era jovem, muito bem apessoado (ou seja, bonito), alto e magro, cabelos escuros, olhos... Bem, ninguém tinha conseguido ver, ainda. 

Quanto mais inventavam, mais as moças ficavam interessadas. Foram à histeria quando se deram conta que ele alugara a casa ao lado da de Vanessa. Com a desculpa de caminhar, as garotas foram analisar a casa e seus limites.  E descobriram que a janela do quarto dela dava para a janela do quarto dele. Aí Vanessa poderia vigiá-lo. Todo dia as amigas perguntavam à ela o que o Humberto (nome do vizinho) fazia o dia todo. Vanessa bancava a misteriosa e não contava muito. Na realidade, ela não conseguira ver nenhuma movimentação. A janela permanecera fechada com as cortinas cerradas. Persistente como era Vanessa continuava espionando.

As festas daquele bairro eram famosas. Bem organizadas, caprichosamente decoradas, excelente escolha das músicas, buffet sofisticado, convidados selecionados. Para a festa de uma das garotas, o vizinho foi convidado. O convite fora enviado impresso para a casa dele. Ninguém sabia seu número de telefone, celular ou face ou qualquer outra rede social. Abordá-lo na rua era impossível, pois pouco saía e quando o fazia era de carro. Lendo o convite, Humberto decidiu ir à festa. Queria desmistificar sua presença que causava muita curiosidade. Também queria conhecer a sua bela e bisbilhoteira vizinha que o vigiava pela janela, por trás das cortinas. Ele percebia seus movimentos, pois fazia o mesmo. 

Em uma noite agradável de primavera, ele se arrumou no melhor estilo ‘casual’ e foi para a festa. Ao chegar, perguntou pela anfitriã e foi cumprimentá-la. Uma moça simpática que fez as apresentações aos seus pais e à suas amigas. Estavam todas ansiosas para conhecê-lo. Todavia, a vizinha não estava nesse grupo. Ele perguntou por ela e indicaram-na dançando. Ele permaneceu conversando com o grupo de moças (encantadas com ele) com a esperança que a vizinha retornasse ao grupo. Assim foi. Eles foram apresentados. Ela era linda! 

Humberto não perdeu tempo e convidou-a para dançar. Quando a música terminou, ele a convidou para tomar alguma bebida. “Então Vanessa, você é minha vizinha da casa de janelas azuis?” Isso mesmo; na do outro lado mora um casal de estrangeiros que está sempre viajando”, respondeu Vanessa. A conversa continuou contando sobre os dois, um pouco do bairro e outros assuntos. Foram descobrindo interesses comuns. As amigas não os deixaram muito tempo sozinhos. Foram se aproximando aos poucos e logo formaram um grupo grande de moças inquietas para conversarem com o atraente vizinho.

Humberto foi educado com todas, mas não incentivou as investidas. Fez-se de desentendido. Dançou com uma das garotas que, na realidade, o convidou para dançar. Depois, conseguiu a companhia de Vanessa e a monopolizou por algum tempo. Ela era bem requisitada pelos jovens para dançar e conversar. Humberto, um pouco mais alto que a maioria, conseguia acompanhar a movimentação de Vanessa, fingindo que olhava o ambiente. Ela era muito graciosa. Uma visão deliciosa observá-la!

Ao saber que Vanessa avisaria ao pai para vir buscá-la, ele se prontificou a levá-la. Seria uma ótima oportunidade para ficarem a sós. Humberto aproveitou para convidá-la a sair no dia seguinte e Vanessa aceitou. Após a despedida, ele vibrou com a chance de sair com ela, pois além de muito bonita, ela era inteligente, com bom senso de humor e boa conversa.

A tarde domingo foi adorável. Deram boas risadas juntos, ao comentarem que se observavam pelas janelas. Ele explicou o que fazia: “sou tradutor juramentado e concursado. Trabalho para o Ministério das Relações Exteriores com a tradução de documentos e simultânea de conferências. Além disso, traduzo livros técnicos para editoras brasileiras. Por isso, posso trabalhar em casa e não sobra muito tempo para sair. “Nem aos sábados e domingos?”, perguntou Vanessa. “Quando eu tenho uma companhia interessante e bonita como a sua, eu tenho tempo sim” afirmou Humberto, olhando bem atentamente para ela e pegando na sua mão. Puxou-a suavemente e a beijou docemente. Vanessa correspondeu com muita ternura.

Depois do domingo, as janelas não estavam mais fechadas e nem as cortinas cerradas. Era bom dia, boa tarde, boa noite com muito diálogo pela janela. Nos finais de semana inventavam passeios. A vontade de estarem juntos se intensificou, então resolveram fazer um curso. Assim, Vanessa tinha uma boa desculpa para sair mais frequentemente. Seus pais já estavam perguntando sobre essas saídas. 

Nesse interim, a família de Vanessa recebeu a visita de primos distantes, que viriam morar na cidade. Estavam procurando casa para comprar. O filho mais velho, um advogado que trabalharia em um escritório local de Advocacia, era muito atraente. Logo se interessou por ela. Pediu sua ajuda para procurar a casa. A mãe de Vanessa se entusiasmou com a atenção que o rapaz dedicava à sua filha. Literalmente empurrou Vanessa para combinar as saídas com ele. Sem jeito, ela não soube como negar. Pensou logo em como explicar o fato ao Humberto, antes que ele a visse saindo com Jorge (o tal primo).        

À noite, no usual contato através das janelas ela explicou, tentando minimizar o fato. Humberto, sempre muito educado e controlado fingiu aceitar o relato, mas seus sentidos o alertaram para o perigo da ‘concorrência’. Quando a viu com o tal primo, ele percebeu a batalha que viria pela frente para manter o amor de Vanessa, por quem estava apaixonado e desejando oficializar um noivado para planejarem o casamento. Ele falaria com o pai de Vanessa, como decidira. 

Esse embate de apaixonados, vocês, queridos leitores, lerão na próxima edição!

Por: Maria Teresa Freire - Jornalista, Escritora, Poeta, 
Presidente da AJEB – Coordenadoria do Paraná.



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Um comentário:

  1. Obrigada querida Maluma pela divulgação no seu blog! Espero que os leitores gostem e aguardem a parte II. Verão que ganhará a batalha pelo amor de Vanessa!

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