Grande parte da genialidade consiste em se enunciar algo que está na frente de todos, mas ninguém antes conseguiu enxergar. Ou se viu, não pensou. Ou se pensou, não disse nem escreveu. Pois bem. A Bíblia está aí há milênios. Falando de comidas e bebidas. Na vista de milhões. Só que, até agora, ninguém tinha se debruçado de modo sistemático, sério e abrangente sobre o assunto. Maria Lecticia Monteiro Cavalcante fez isso. Durante dez anos trabalhou minuciosamente. O resultado é o livro “A Mesa de Deus - Os Alimentos da Biblia”, que já está fazendo sucesso no Brasil e em Portugal. Traduções já estão em curso para diversas línguas.  Com esse livro, Pernambuco consolida uma recuperação gradual de um protagonismo literário nacional, que parecia perdido, na era pós Mauro Mota, Gilberto Freyre, Ariano Suassuna. E com Marcos Vilaça em justíssima aposentadoria literária.  Essa recuperação deve muito a um casal muito especial. Ambos da Academia Pernambucana de Letras.

RENASCIMENTO 

Diz um antigo provérbio que, a cada 50 anos, a humanidade produz um livro genial. O casal José Paulo e Maria Lecticia Monteiro Cavalcanti está aí para desmentir o ditado. José Paulo lançou, já neste milênio, uma volumosa e minuciosa quase autobiografia do grande poeta português Fernando Pessoa. Fez sucesso. Correu mundo. Garantiu ao autor lugar nas Academias Brasileira e Portuguesa de Letras. Agora, chegou a vez da esposa. Com um livro que basta ler o título para entender a proposta. Carrega a semente da genialidade desde a concepção.  “ A Mesa de Deus - Os Alimentos da Bíblia”, abre caminho justo e merecido para a ABL. Desde já, estamos na torcida. Afinal, até onde sei, apenas um casal usou simultaneamente o fardão da imortalidade, Jorge Amado e Zélia Gattai. Imaginem que glória será...

ARTESANATO

Ano após ano a autora leu, releu e anotou inúmeras vezes o livro mais publicado do mundo.  Levantou cada alimento citado. Mais. Pesquisou a forma de preparo e o contexto histórico do qual faziam parte. Algo, realmente, para marcar o presente e ficar para a posteridade.  

O consagrado crítico literário internacional

Edmílson Caminha, analisou a obra em profundidade.

Disse ele: 

“É grande a bibliografia mundial sobre a história da alimentação, o preparo da comida, os valores antropológicos, sociológicos, culturais e religiosos do que não aparenta mais do que a cotidiana providência de saciar a fome e aplacar a sede. A esses livros junta-se, agora, A mesa de Deus (Rio de Janeiro : Record, 2022), da pesquisadora e escritora Maria Lecticia Monteiro Cavalcanti. Será, doravante, citação obrigatória nos estudos do gênero que se fizerem, aqui e no mundo”.

QUEM APRESENTA

Na apresentação da obra, escreve o importante cardeal português Dom José Tolentino Mendonça, prefeito, no Vaticano, do Dicastério para a Cultura e a Educação:

“Para os leitores da Bíblia, o livro de Maria Lecticia oferecerá estratos complementares de conhecimento: constitui uma espécie de micro-história da Bíblia (...). Mas, ao mesmo tempo, é um livro de espiritualidade bíblica, um compêndio de exegese, uma refeição da Palavra. Não é apenas um ensaio exaustivo sobre a mesa bíblica: é um convite a entrar, um abrir da mesa, uma coreografia de odores, uma prática do saborear”.

DETALHES

Maria Lecticia percorre milênios da história humana com atenção e minúcia de admirável investigadora.  Anota 3.594 menções bíblicas a animais, 343 a espécies de plantas e 230 a vinho. A ilustrar-lhe as informações, referências a Gilgámesh e a Os Lusíadas, a São Tomás de Aquino e ao Padre António Vieira, a Guerra Junqueiro e a Fernando Pessoa. Na relevante e numerosa bibliografia que apresenta aos leitores, destacam-se Gilberto Freyre (Açúcar), Câmara Cascudo (História da alimentação no Brasil), Lévi-Strauss (O cru e o cozido), Eva Celada (Os segredos da cozinha do Vaticano) e Chiara Frugoni (Invenções da Idade Média: óculos, livros, bancos, botões e outras inovações geniais) – este, a propósito dos assentos sem os quais não haveria como abancar-nos à mesa.

DA MAÇÃ À ÚLTIMA CEIA

O livro de Maria Lecticia faz uma viagem milenar, deliciosa. Uma obra que toca, envolve, agrada, emociona.

Uma obra prima. Única. Genial. Uma leitura que encanta e enriquece. Espero que esteja brevemente nas bibliotecas públicas para que todos possam degustar esta obra-prima.