O SEGREDO PRESERVADO

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Maria Teresa Freire.


Ele terminara sua palestra, sob aplausos entusiasmados. Estava acostumado com aquela reação. Não o impressionavam mais. Ele falara sobre diversas formas de construção que não afetavam o meio ambiente. Sem destruir florestas, inundar campos produtivos, desabrigar moradores, desapropriar terras. Sua empresa era conhecida pelas construções integradas ao meio ambiente. Suas edificações respeitavam a flora, a fauna, sobretudo o desejo das pessoas em viver próximas à natureza, sem agredi-la, sem se sentirem aprisionadas entre o cimento cinza e o ferro que o sustenta. 

Ele, um empresário de sucesso, comandava uma holding empresarial, gerindo companhias de diferentes áreas, que davam suporte à construção civil, produzindo equipamentos, artefatos, maquinários, peças, enfim todo o aparato necessário para criar projetos imobiliários bonitos, contemporâneos e conectados à natureza. Participava de campanhas em defesa do meio ambiente, financiava programas de recuperação de centros históricos. Era sempre convidado para palestrar, participar de debates ou apoiar projetos e campanhas relacionados ao meio ambiente. Um nome bem conhecido nessa área.  

Roberto realizou a palestra sobre “avanços tecnológicos para proteção do meio ambiente” e foi muito aplaudido, pois é um participante ativo das campanhas em favor da defesa do meio ambiente. Após a palestra foi apresentado à várias pessoas, dentre elas uma moça que lhe causou uma forte e interessante impressão. Ela se comportava timidamente na apresentação à Roberto e quase nem olhava para ele. Entretanto, ele iniciou uma conversação com ela, que foi obrigada a olhar para ele. Então, consegue vê-la. Bonita, mas não muito. Cabelos negros longos emoldurando o rosto delicado. O impacto fica por conta dos olhos. Eram cinza? Violeta? Esverdeados? Conforme ela mudava a posição da cabeça e a luz insidia nos olhos, eles mudavam de cor.  Aqueles olhos ficaram gravados na mente dele. Ele queria vê-los novamente. Para confirmar a cor predominante.

Marina, como ela se chamava, foi apresentada como artista plástica. Pintava principalmente paisagens e era grande defensora do meio ambiente. Ela expunha seus quadros em exposições solos e coletivas. Mas não se fazia presente. Sua melhor amiga realizava todos os trâmites das exposições e a representava. Às vezes, concedia entrevistas privadas, em local reservado.  Também, esporadicamente, oferecia cursos de pintura, por muita insistência dos interessados, mas para grupos bem pequenos. Não aceitava de forma alguma grande quantidade de alunos. Como suas pinturas eram excepcionais, havia muitos inscritos, todavia ela não cedia e no máximo eram oito alunos, sem explicar a razão dessa pequena quantidade. 

Suas pinturas eram famosas, bem vendidas, mas ninguém a conhecia. Inclusive, Roberto havia adquirido algumas telas assinadas por ela, pois retratavam cenas da natureza de forma muito delicada. Ele comparecia às suas exposições, todavia ela nunca estava presente. Ele se perguntava a razão da ausência dela.  O encontro foi acontecer na pequena cidade do interior que ele visitava, pois tinha um importante empreendimento imobiliário no local. Ela despertou sua atenção. Aproveitou o ensejo de encontrá-la e convidou-a para jantar no dia seguinte, com a desculpa de ver suas telas.  Ela hesitou em aceitar, mas ele também convidou sua amiga com o noivo e não houve como evitar. 

Durante o jantar ficou sabendo que ela era uma enxadrista. Havia sido uma expert sem oponentes quando bem jovem. Depois sumiu dos campeonatos de xadrez. Descobrir informações sobre Marina só a deixava mais atraente para Roberto. Queria passar mais tempo com ela. Durante a conversa, falou que ficaria na cidade por um período maior, em função do empreendimento. Ninguém precisava saber que era por causa dela. Mostrou interesse na sua pintura: “Marina, comprei vários quadros seus, da ultima exposição. Encantaram-me suas paisagens!” Ela olhou surpresa para ele: “então foi você que comprou quase todas as telas? Nem deu tempo para outros compradores decidirem-se!” comentou ela sorrindo. Observando-a Robert pensou: ‘como fica bonita sorrindo; os olhos sorriem junto’. 

Aproveitou o ensejo e convidou-a para visitar a construção, planejado para interagir com a natureza do local, como Robert explicou. O mais importante: ele queria encomendar quadros a ela, para decoração das casas que formariam o condomínio. E dessa forma, com a desculpa de escolher as paisagens junto com ela, ajudando a carregar o material, ele passava os dias na companhia de Marina. Enquanto ela pintava, ele observava-a. Quanto mais o fazia, mais se encantava. 

Quando disse que ela não era muito bonita, havia se enganado. Seu rosto era diferente: expressivo, com feições irregulares denotava inteligência, perspicácia. Aquela boca, que parecia tão macia e gostosa para beijar era uma atração para ele. Entretanto, eram aqueles olhos grandes, de ‘furta-cor’ cuja imagem não saiam da sua mente. Ele queria se aproximar mais, abraçá-la, beijá-la, mas ela era distante. Em um instante esquiva e no outro frágil. Ele percebia que ela fugia de pessoas. Mesmo com grupos pequenos ela dava um jeito de se esgueirar e desparecer. 

Uma noite chuvosa, Robert viu Marina caminhando aos tropeços. Ela parecia tonta, sem rumo. Ao se aproximar viu que ela chorava. Abraçou-a e conduziu-a para a casa que ele alugara. Não queria que ninguém a visse daquela maneira, descontrolada. Fez com que trocasse a roupa molhada pelo roupão, deu-lhe conhaque e acendeu a lareira para aquecê-la. O choro parava e continuava. 

Robert abraçou-a novamente e perguntou: “o que aconteceu?” Ela achegou-se mais ainda a ele e disse entre soluços: “muita gente ao meu redor. Eu fico apavorada. Nem quero pensar e falar disso. Também me assusta relembrar”. Continuaram abraçados e Roberto a beijou delicadamente no início. Ela correspondeu e o beijo se intensificou. Outras carícias se seguiram que ela aceitava com suspiros e retribuía com paixão. Naquele momento, Roberto não queria perguntar sobre o acontecido, só queria ter a chance de amá-la. Amá-la?  Sim, estava apaixonado por Marina. 

O amor dos dois, que ele queria demonstrar e ela timidamente escondia, eclodiu com força. Um desejo ardente de sentirem um ao outro por inteiro. Uma paixão intensa que dominava os dois. Finalmente, ele a encontrava como desejou desde o primeiro momento em que a viu. Nos braços dele para ser muto amada. 

Entretanto, por que Marina tinha tanto medo das aglomerações? Qual seria o segredo guardado que ocasionava esse comportamento? Mais tarde ele descobriria. Agora só queria amá-la, com toda a força do seu sentimento.

Por: Maria Teresa Freire - Jornalista, Escritora, Poeta, 
Presidente da AJEB – Coordenadoria do Paraná.



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