O DIREITO NO COTIDIANO

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Dr. Alex Fernando da Silva.


Caros leitores e seguidores, nesta edição, abordarei um tema que ainda nos gera grande preocupação e é presente no dia a dia das famílias, infelizmente: A violência doméstica e familiar. Para abordar esse tema de forma mais empática, de mulher para mulher, convidei a minha querida amiga e grande profissional, a Dra. Maria Eduarda Trajano.  Em suas palavras, ao receber o convite, transmitiu: sinto-me lisonjeada com o convite do Nobre Colega e Amigo, Dr. Alex Fernando, para como advogada e mulher, tratar de um assunto extremamente delicado e que, infelizmente, em sua grande maioria é recorrente contra o gênero feminino: A violência doméstica e familiar que pretendo tratar de forma clara e instrutiva.

A luta pela garantia de políticas públicas e direitos básicos da mulher vem, lentamente, conseguindo espaço, uma vez que ao se tratar de violência, a mulher passa a ser o alvo principal em diversas formas e intensidades, motivando crimes hediondos, violações de direitos humanos, causando danos e sequelas, por vezes irreversíveis, quando não resultam em feminicídio. Ainda assim, a violência doméstica é amplamente repetida, responsabilizando a mulher pela violência sofrida e minimizando a gravidade da questão.

Uma das imagens mais associadas à violência doméstica e familiar contra as mulheres é a de um homem (companheiro, marido, namorado ou ex.) que agride a parceira, em sua maioria, motivado pelo sentimento de posse sobre a vida e escolhas dessa mulher. De fato, embora esse cenário seja o mais recorrente, esse velho roteiro se apresenta em outras situações que vão desde a pressão psicológica, chegando à agressão física, podendo levar a crimes bárbaros.

Uma das grandes vitórias quanto ao tema foi a Lei Maria da Penha (Lei de nº 11.340/2006) que abriu um leque de formas de violência doméstica que vão além das relações amorosas, ou seja, não se restringe às relações afetivas e pode haver violência doméstica e familiar independentemente do parentesco. O agressor pode ser o padrasto/madrasta, sogro/a, cunhado/a ou agregados – desde que a vítima seja uma mulher, em qualquer idade ou classe social.

O que diz a Lei Maria da Penha?

Violência doméstica e familiar contra a mulher é qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial, conforme definido no artigo 5º da Lei Maria da Penha (a Lei nº 11.340/2006).

Com base na referida Lei, a mesma define cinco formas de violência doméstica e familiar, deixando claro que não existe apenas a violência que deixa marcas físicas evidentes, pois temos:

A violência psicológica: que xinga, humilha, ameaça, intimida e amedronta, critica, desvaloriza, desconsidera a opinião ou decisão da mulher; debocha e diminui a autoestima, além de controlar  e chantagear, são alguns exemplos de violência psicológica;

A violência física: bater e espancar; empurrar, atirar objetos, sacudir, morder ou puxar os cabelos; mutilar e torturar; usar arma branca, como faca ou ferramentas de trabalho, ou de fogo;

A violência sexual: forçar relações sexuais quando a mulher não quer ou quando estiver dormindo ou sem condições de consentir; fazer a mulher olhar imagens pornográficas quando ela não quer; obrigar a mulher a fazer sexo com outra(s) pessoa(s); impedir a mulher de prevenir a gravidez, ou forçá-la a engravidar, ou ainda forçar o aborto;

A violência patrimonial: controlar, reter ou tirar dinheiro dela; causar danos de propósito a objetos de que ela gosta; destruir, reter objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais e outros bens e direitos;

A violência moral: fazer comentários ofensivos na frente de estranhos e/ou conhecidos; humilhar a mulher publicamente; expor a vida íntima do casal para outras pessoas, inclusive nas redes sociais; acusar publicamente a mulher de cometer crimes; inventar histórias e/ou falar mal da mulher para os outros com o intuito de diminuí-la perante amigos e parentes.

Além da ação, ou seja, cometer os crimes descritos, a omissão diante da violência também é responsabilizada pela Lei. “Fazer de conta que não viu”, omitir-se ou ser conivente com uma agressão aos direitos da mulher também é uma maneira de praticar violência.

Quem é o agressor?

A Lei Maria da Penha define que a violência doméstica e familiar pode ocorrer no âmbito da unidade doméstica, no âmbito da família ou em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

E a Lei Maria da Penha destaca no parágrafo único de seu artigo 5º: “as relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual”.

Quem pode praticar a violência, então:

1) Segundo a Lei Maria da Penha, a violência pode partir de maridos, companheiros, namorados – ex., ou atuais e que morem ou não na mesma casa que a mulher.

2) A Lei Maria da Penha aplica-se tanto às relações heterossexuais como a casais de mulheres.

3) Mas, a Lei Maria da Penha não se restringe às relações amorosas, ou seja, também vale para a violência cometida por outros membros da família, como pai, mãe, irmão, irmã, padrasto, madrasta, filho, filha, sogro, sogra – desde que a vítima seja uma mulher, em qualquer faixa etária.

4) A Lei Maria da Penha também se aplica quando a violência doméstica ocorre entre pessoas que moram juntas ou frequentam a casa, mesmo sem ser parentes, como um cunhado ou cunhada.

Em resumo, a violência doméstica e familiar pode ser praticada por qualquer pessoa que tenha ou teve relação íntima e de afeto com a vítima, independentemente do sexo dessa pessoa. Então, embora apareçam como maioria nas pesquisas, os agressores não são apenas homens.

Denunciar, porém, não é fácil quando as agressões partem de uma pessoa com quem a vítima mantém relações íntimas de afeto, cujo rompimento coloca questões emocionais, financeiras e objetivas, que envolvem a desestruturação familiar e traz a dificuldade de provar a violência sofrida.

Em sua grande maioria, não se tem provas concretas quanto aos fatos ocorridos da violência. A dificuldade de consubstanciar provas se mistura com o lado afetivo e a esperança que o outro vai mudar, fazendo com que perdure a situação e se agrave cada vez mais. Neste cenário complexo, a prática faz com que a falta de conhecimento sobre as especificidades desse tipo de violência acabe não sendo devidamente acolhidas pelos serviços de atendimento.

A Lei nº 11.340 introduziu ainda uma ferramenta importante que possibilita a intervenção do Estado em uma situação de violência de modo quase imediato, na busca de proteger a vida da mulher: as chamadas medidas protetivas de urgência.

Como o próprio nome diz, essas medidas têm o objetivo de proporcionar proteção à mulher que está sofrendo violência. Algumas medidas são voltadas à pessoa que pratica a violência, como o afastamento do lar, proibição de chegar perto da vítima e suspensão de porte de armas. Outras medidas são voltadas à mulher, como o encaminhamento para programa de proteção ou atendimento pelos diferentes serviços do Poder Público.

Lei nº 11.340/06 mais conhecida como Lei Maria da Penha, completou 16 anos mudando a realidade de diversas mulheres. Ainda em 2022, a Lei nº 14.310/22 determinou o registro imediato, pela autoridade judicial, das medidas protetivas de urgência em favor da mulher em situação de violência doméstica e familiar ou de seus dependentes.

Essa alteração permite que, para requerer essa proteção, a mulher não precisa estar acompanhada de advogada(o). As medidas protetivas têm caráter autônomo, ou seja, não dependem da instauração de inquérito policial nem de ação penal. Assim, o juízo tramitará o pedido com rapidez para que a proteção seja efetiva.

Outra recente mudança, que tornará ainda mais célere e efetiva a proteção das Mulheres, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou válida a alteração promovida na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) para permitir que, em casos excepcionais, a autoridade policial afaste o suposto agressor do domicílio, ou do lugar de convivência quando for verificado risco à vida, ou à integridade da mulher, mesmo sem autorização judicial prévia. A decisão, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6138, julgada na sessão do dia 23/03/2022, foi unânime.

De acordo com a norma, introduzida pela Lei 13.827/2019, diante do risco atual, ou iminente à mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou a seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado​ do local. A medida poderá ser implementada pelo delegado de polícia, quando o município não for sede de comarca​ (quando o juiz responsável não mora na localidade), ou pelo policial, quando não houver delegado disponível no município no momento da denúncia. Nesses casos, um juiz deve ser comunicado, em no máximo 24h, para decidir sobre a manutenção ou revogação da cautelar.

O avanço legislativo, entretanto, ainda não representa a garantia de uma vida livre de agressões para uma parcela significativa das milhões de brasileiras, mas visa diminuir a distância entre o texto legal e a efetiva fruição do direito.

É com o intuito de investir nos serviços especializados e garantir sua expansão no território nacional com qualidade e democratizar o acesso à Justiça no País que se deve levar informação, pois, para a mulher quebrar o silêncio sobre sua situação de violência, a decisão é muito grave e difícil. Por isso, os serviços de atendimento precisam estar bem equipados e com capacidade de acolhimento, prevenção e proteção à, nós, mulheres.

A mídia tem um importante papel no enfrentamento da violência contra as mulheres. É necessário que, cada vez mais, a mulher tenha noção de seus direitos. É preciso divulgar mais os instrumentos da Lei que garantem a segurança e os direitos das mulheres, como as medidas protetivas de urgência, a estabilidade no emprego e a assistência jurídica e psicossocial.

Uma mulher agredida que não souber como se portar, o que fazer, a primeira coisa é: procure um excelente advogado e a rede de proteção à mulher na sua cidade, até mesmo antes de ir à delegacia. Não vá à delegacia só. Nos casos de violência psicológica e moral, além de fotos, vídeos e testemunhas que possam ter, procure sempre um psicólogo para que ele possa atestar esse estado de violência, é extremamente importante. A mulher que denunciar seu agressor em via de regra não poderá desistir depois, é preciso lembrar também que qualquer pessoa pode fazer a denúncia, inclusive, anônima.

Nesta busca por equidade de gênero, é preciso mostrar que as mulheres não querem acesso à Justiça porque são vítimas, mas, porque são sujeitos de direitos.

Aos leitores e seguidores, um forte abraço! Espero que gostem. Fiquem com Deus!

Referências:

https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=483963&ori=1

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm

 

Texto escrito pela Drª. Maria Eduarda Trajano com a colaboração do Colunista, Drº. Alex Fernando. Drª. Maria Eduarda Traja é Advogada, inscrita na OAB/PE 57.458, Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil, Membro da Comissão Especial de Assistência aos Novos Advogados da Subseccional Limoeiro/PE.

 

https://portal.stfjus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=483963&ori=1

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm


Por: Alex Fernando da Silva - Alex Fernando da Silva é Advogado, Especialista em Direito Público, Mestrando em Direito, Presidente do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente e Sustentabilidade de Surubim/PE (COMDEMAS), Assessor Jurídico dos Conselhos Municipal, Escritor e Palestrante.



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